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Os leitores do blog certamente já ouviram falar de Conan, o Bárbaro. Seja pelos filmes estrelados por Arnold Schwazenneger, seja pelos gibis da Marvel ou mesmo pelo seu autor e criador, o texano Robert Ervin Howard (1906 – 1936). Versarei apenas sobre as histórias do conterrâneo de Bush, ou melhor, sobre o único romance por ele escrito que tem como protagonista o selvático guerreiro das colinas da Ciméria, ignorando, por ora, duas dezenas de contos sobre o mesmo.
Os delírios pueris de Howard foram a sua maior inspiração para a criação de Conan. Mesmo nos idos de 1900, quando ainda não existiam RPGs e games, crianças já sonhavam com passados heróicos, espadas manejadas por punhos firmes e decididos, guerras épicas por poder em eras imemoriais, enfim, toda essa aura mística e ingênua que nos acomete apenas nas primeiras idades. Contos de terror/horror já não eram grandes novidades, depois de Mary Shelley e Bram Stoker, respectivamente autores de Frankenstein e Drácula, e também deram gás à imaginação de Howard ao criar oponentes poderosos para o seu herói.
O romance A Hora do dragão fora publicado após a maioria dos contos de Howard, entre 1935 e 1936, anterior apenas às suas obras póstumas. Com 22 capítulos, o livro já nos traz Conan na pele do rei de Aquilônia, reino de um mundo fantástico pré-glacial e imediatamente posterior à queda de Atlântida, engolida pelo mar. Ler o livro, assim como comentá-lo, antes da obra é como assistir a uma novela a partir dos últimos capítulos: sem conhecer por completo a trajetória inimaginável do guerreiro ao deixar a Ciméria, indo lutar ao lado dos aesires, aprisionado, cativo, corsário, prisioneiro, insurgente e, finalmente… rei, por usurpação do trono.
A Hora do dragão trata de guerra e política num mundo antigo. Os nemésios, unidos à decaída linhagem real do aquilônios, tramam a ressurreição de um antigo feiticeiro para derrubar Conan. Nos primeiros parágrafos, fica evidente uma parceria tão firme quanto um prato de cremogema: nemésios e aquilônios são inimigos históricos, subdivisões remanescentes de um reino antiqüíssimo e opressor, extinto há milhares de anos, o reino negro de Acheron.
Valerius, Tarascus, Amalric e Orastes tinham em comum o interesse pela morte de Conan, e para isso lançaram mão de um antigo artefato mágico para dar fôlego ao mago mumificado, que atendia pelo nome de Xaltotun, outrora um dos pilares de Acheron. Este era o único com sabedoria e poder suficientes para dizimar os poderosos exércitos da Aquilônia e pôr de joelhos o vigoroso e invencível Conan. E por aí se desenrola o fabuloso enredo de lutas, seres sobrenaturais, buscas impossíveis e muito, muito sangue.
Primeira observação: o romance não tem nenhuma pretensão além der ser lido prazerosamente. Nada de metáforas da realidade, de críticas subjacentes aos poderes constituídos, à sociedade, à violência… uma verdadeira fuga do mundo plausível rumo ao imaginário. E nada melhor do que isso numa sexta-feira à noite, quando o cidadão está cansado da labuta e tem um curto período de descanso pela frente.
Apesar do texto intensamente descritivo, a leitura é tão fluida que as linhas vão descendo pelo nosso entendimento como vinho suave, e as ideias vão entrando na nossa cabeça fácil que só faca em melancia. Em uma noite eu li 17 capítulos sem pestanejar.
A mistura de várias mitologias também é marcante: rapidamente mencionado no livro, porém mais citado em outros contos, Ymir é o gigante de gelo do mundo nórdico (aesires e vanires são mencionados em outros manuscritos, e também correspondem à cultura nórdica). Set é, ou pelo menos soa como, parte do mundo egípcio; no conto, o povo da Stygia, que o venera, vive próximo ao deserto junto a túmulos semelhantes às pirâmides. Outros deuses foram simplesmente criados por Howard, como Crom (deus venerado por Conan), Mitra, Asura, Ishtar, entre outros.
Os simbolismos e reinos também saíram da pena de Howard. O dragão que dá nome ao livro é o estandarte da raça dos nemésios, enquanto o leão representa os aquilonianos; já o leopardo escarlate diz respeito poitanianos, e assim segue com os demais. Nenhuma especulação sobre a veracidade desses reinos, repito: apenas a fantasia.
Certamente os leitores mais maduros e ocupados em ganhar a vida não vão gostar… mas aqueles que gostam de uma aventura descompromissada de vez em quando vão curtir A Hora do dragão, que tem pouco romance, muita pancadaria, personagens assombrosos e nada de realidade.